Por Filipa Ventura, Joana Gomes e Thais Sant’Anna (estudantes do Mestrado em Marketing e Comunicação, do Instituto Politécnico de Coimbra) e Joana Lobo Fernandes (docente)
Ligar a academia à realidade organizacional é um objetivo em que todos saem a ganhar. Ganha a academia, ao proporcionar uma aprendizagem prática e aplicada, e ganha a organização, ao receber insights inovadores e refrescantes. Essa ligação também acontece quando a academia está atenta, e reflete, sobre o que a impacta e às organizações. O conluio que envolveu 14 bancos em Portugal foi uma oportunidade para esta ligação. Assim entendeu a turma do 1º ano do Mestrado em Marketing e Comunicação, do Instituto Politécnico de Coimbra.
Entre 2002 e 2013, 14 bancos a operar em Portugal estiveram envolvidos num esquema de troca de informação comercial sensível, com partilha de dados confidenciais de clientes sobre a oferta de produtos de crédito na banca de retalho, mais concretamente crédito à habitação, crédito ao consumo e crédito a empresas. Através de contactos informais e sem o conhecimento dos clientes, cada banco, através dos seus departamentos de marketing e de gestão de produto, facultava aos restantes informações estratégicas como os spreads a aplicar num futuro próximo, nesses produtos bancários, ou os montantes de crédito concedido, em meses anteriores. Esta prática constituiu uma violação grave das regras da leal concorrência, contrariando um dos principais benefícios de um funcionamento livre dos mercado, ao permitir antecipar os movimentos dos concorrentes e alinhando ofertas e comportamento comerciais, reduzindo a pressão concorrencial e prejudicando os consumidores de uma verdadeira liberdade de escolha (informada).
Em 2021, a Autoridade da Concorrência condenou os bancos envolvidos ao pagamento de coimas num valor global de 225 milhões de euros. Esta decisão foi contestada pelos bancos. Mas, para além das sanções financeiras, este caso tem um impacto significativo na reputação dos profissionais de marketing, tendo sido exposto o seu protagonismo no “conluio da banca”, o que levantou questões sobre ética profissional, transparência e proteção dos consumidores. Por tudo isto, constitui-se como uma oportunidade para pensar a ética dos profissionais de marketing e o papel relevante da APPM neste tópico.
Este foi, então, o mote para um trabalho aplicado no âmbito da unidade curricular de Planeamento e Gestão Estratégica da Comunicação, do mestrado acima identificado. A partir desta situação, e tendo a APPM como entidade emissora, pois representa os profissionais de marketing em Portugal, foram elaborados um conjunto de planos de comunicação (Xifra & Lalueza, 2009) que visavam o reforço da valorização da ética no exercício profissional em marketing. Estes planos tiveram como destinatários, os atuais associados da APPM, os docentes e a direção das Escolas de Negócio, os estudantes dessas mesmas Escolas e ainda o público em geral, enquanto consumidores que todos somos.
Os planos de comunicação que tinham como destinatários os atuais associados da APPM definiram como meta a alcançar um reforço da sensibilização para uma conduta profissional ética, apoiado num conhecimento aprofundado do código de conduta da Associação. As ações programadas inserem-se nos C de conhecimento e competências, que são já pilares de atuação da APPM. Mas é possível robustecer o enfoque dedicado à ética e às boas práticas, e ao sentido de responsabilidade profissional. Assumindo que cada associado é um embaixador da APPM e da profissão, os planos de comunicação desenvolvidos para estes seguiram as linhas argumentativas: “Reafirmar o Compromisso com o Marketing Responsável” e “Profissionais que Influenciam. Marketing que Transforma!“.
As Escolas de Negócios foram igualmente identificadas como destinatários-chave para uma ação de valorização de uma conduta profissional suportada em valores e deveres. Enquanto atores-chave na formação de profissionais de marketing, importava impactar não só o corpo dirigente e docente como também os atuais estudantes/futuros profissionais. Para os dirigentes e corpo docente, a meta pretendida visava obter um maior compromisso com uma formação científica, técnica e relacional que espelhasse uma clara orientação para o respeito e valorização do código de conduta da APPM. Para os estudantes destas Escolas, e recetores da formação ministrada, importava uma tomada de consciência do seu papel enquanto agentes de mudança para a profissão, num comprometimento permanente com o respeito pelos consumidores, pelos concorrentes e pugnando por um funcionamento dos mercados leal e transparente. Para tal, é relevante que estes estudantes entendam o código de conduta da APPM como um instrumento de trabalho e um referencial permanente. Os planos desenvolvidos sustentaram-se no mote “Ética e Transparência: os pilares do marketing do futuro” e ainda “A base de um bom marketing é a prática da ética”.
Por último, o cidadão-consumidor também foi um destinatário dos planos de comunicação. Com este, o profissional de marketing é chamado a construir relações de confiança, entendendo o seu papel enquanto motor do mercado, e deve fazê-lo com elevado sentido de responsabilidade (social). Também aqui, o código da APPM é um farol orientador para a consolidação do marketing, enquanto ciência e prática ao serviço do consumidor. Por isso, a linha argumentativa espelha essa vontade, pugnando por um “Marketing ético: A base da confiança e da responsabilidade no mercado” e reconhecendo que a “Confiança constrói relações”.
Em jeito de resumo, destacamos o papel que o código de conduta deve assumir em contexto de associação profissional, atuando enquanto guia de ação, reflexo da maturidade da profissão e dos seus profissionais, e evidência de um compromisso a favor do consumidor. As associações profissionais, como a APPM, desempenham um papel fundamental na valorização da profissão e na promoção da ética. Mais do que representar os seus membros, atuam como guardiãs da credibilidade do setor, estabelecendo padrões de conduta e boas práticas. O caso do conluio da banca evidenciou como as ações individuais podem comprometer a reputação coletiva. Essa lógica, de reputação em cadeia, mostra que comportamentos antiéticos isolados afetam a imagem de toda a profissão e da associação que a representa. Nesse contexto, a atuação da APPM é estratégica. Além de promover formação contínua e certificações, a associação disponibiliza um código de conduta que orienta decisões éticas e responsáveis. Estudos apontam que as associações que oferecem valor percebido aos seus membros – como capacitação e estrutura ética – aumentam o compromisso e a defesa da profissão (Ki & Wang, 2016; Gruen et al., 2000).
Como futuros profissionais do setor, e após a elaboração dos planos de comunicação, defendemos que reforçar uma cultura ética não deve ser apenas uma resposta a crises reputacionais, mas um investimento na sustentabilidade da profissão. Ao promover transparência e responsabilidade, entendemos que a APPM fortalece a confiança do mercado e protege os profissionais comprometidos com uma atuação íntegra e de excelência.
APPM. (2024). Código de Conduta da APPM. Associação Portuguesa de Profissionais de Marketing. https://appm.pt
Gruen, T. W., Summers, J. O., & Acito, F. (2000). Relationship marketing activities, commitment, and membership behaviors in professional associations. Journal of Marketing, 64(3), 34–49. https://doi.org/10.1509/jmkg.64.3.34.18030
Ki, E. J., & Wang, Y. (2016). Membership benefits matter: Exploring the factors influencing members’ behavioral intentions in professional associations. Nonprofit Management and Leadership, 27(2), 199–217. https://doi.org/10.1002/nml.21232
Xifra, J. & Lalueza, F. (2009). Casos de relaciones públicas y comunicación corporativa. Pearson Prentice Hall.





